domingo, 16 de janeiro de 2011

Não conheço este time - parte 2

O repórter de uma grande rede de televisão pergunta para o jogador do Bahia:
- Você já ouviu falar do time X? – Isto se referindo a um time de Vitória da Conquista, contra quem vai jogar na estréia do campeonato.
O jogador responde:
- Não! Nunca ouvi falar. Não conheço.
No domingo tão esperado, a equipe do interior, jogando em casa, vence o da capital e jogadores e torcedores veem no resultado uma resposta à maneira pedante como o tal jogador se referiu ao time que dizia não conhecer.
Esta não é uma situação hipotética em relação à história do futebol baiano. É janeiro de 2011. O atacante do Bahia, Camacho, vindo do Flamengo como reforço para o tricolor, em entrevista para a televisão na semana que antecede a partida, disse que não conhecia o Serrano Sport Club. No domingo ensolarado, o Serrano vence o Bahia por 2 a 1. Pelas ondas do rádio, ouve-se o desabafo ofegante de jogadores que, usando as forças que ainda lhes restam, dão uma resposta ao que chamaram de falta de humildade, notada nas declarações de jogadores do Bahia.
Não é a primeira vez que isso acontece. É janeiro de 1999. O Bahia se prepara para a partida de estréia no campeonato baiano, que será realizada no Estádio Lomanto Júnior, em Vitória da Conquista, contra o Conquista Futebol Clube. Um repórter de uma grande rede de televisão pergunta para Dimba, atacante do Bahia, vindo do Botafogo, do Rio de Janeiro:
- Dimba, você conhece o Conquista? Sabe onde fica Vitória da Conquista?
No que Dimba responde:
- Não! Não conheço. Não sei onde fica.
Chega o domingo de sol e o Conquista vence o Bahia por 1 a 0, com gol do meio campo Naldinho. Ofegantes, os atletas conquistenses desabafam, exibindo aquele 1 a 0 como um troféu ante à maneira como o atacante do time da capital se referia ao do interior.
Cabe perguntar: nós sabemos onde ficam as três principais cidades de cada estado brasileiro? Se sou mineiro e sou contratado para jogar no Sport, de Recife, saberei quem é o Cabense, de Cabo de Santo Agostinho? Saberei dizer, em uma das minhas primeiras entrevistas para a TV de Recife, como chegar a Cabo de Santo Agostinho? Mais: será que na pergunta do jornalista está somente o desejo de botar lenha na fogueira e esquentar os bastidores do campeonato ou a pergunta, por si só, demonstra mesmo o sentimento de superioridade que eles da capital têm em relação ao interior?
Retornando aos fatos que motivaram este texto, parece-me que todas as perguntas têm um pouco de razão. Primeiro, é evidente que Camacho, imagino eu, nunca deve ter viajado pelas cidades baianas e, muito menos, consultado um mapa antes de ir para o Bahia. O conhecimento requer um mínimo de paciência e tempo. O processo é gradual, precisa de acontecimentos marcantes, pedagógicos e, a partir desta derrota, ele certamente vai saber onde fica Vitória da Conquista. Ele se lembrará muito bem das cores da camisa do Serrano.
Em segundo lugar, tentando responder a terceira pergunta, até acho que o repórter em sua função busca esquentar os momentos antecedentes à partida. Contudo, nota-se, muito mais, a influência de um posicionamento em relação aos times do interior. Vejamos como serão as manchetes dos veículos da capital. Certamente, leremos e ouviremos: Bahia e Vitória perderam na estreia do Campeonato Baiano. Em lugar de: Serrano e Colo-Colo vencem Bahia e Vitória na estreia do Campeonato Baiano.
Diante destes argumentos, dirão: o autor do texto concorda, então, que o desabafo dos jogadores do Serrano é pertinente. No que respondo: não, necessariamente! Estes desabafos não fazem o menor sentido. E explico.
Em uma das entrevistas ao final da partida, que ouvi pelo rádio, o jogador Samuel dizia que aquela vitória era uma resposta a tudo o que eles haviam acompanhado pela imprensa, por meio de notícias que falavam de uma superioridade do Bahia sobre o Serrano, de um favoritismo e, também, de jogadores que diziam não conhecer o Serrano. Até aí, ótimo. Porém, o próprio Samuel lembra como foi difícil a caminhada do Serrano até ali, falando da pré-temporada realizada na pequena cidade de Ituaçú. Nas palavras de Samuel, Ituaçú é definida por ele, como um lugar pequenininho, que não tem nada... Basta ouvir a entrevista cedida ao radialista conquistense Luiz Carlos Dudé, para comprovar que não é criação da minha cabeça.
E aí, o meu principal interlocutor é Samuel. Samuel, será que tratar Ituaçú como uma cidade que não tem nada, não dá no mesmo que dizer que eu não conheço Vitória da Conquista e não sei como chegar lá? Será que não ter conhecimento de que Ituaçú é a terra de gente notável como Moraes Moreira não lembra o tom daquela entrevista de Camacho? Será que não saber que Ituaçú tem lugares belíssimos, como a gruta da Mangabeira, não é sinônimo de não ter ideia de que pra que lado fica Vitória da Conquista?
Bom, tomara que o Quinze de Agosto ou o Esperança, times amadores de Ituaçú, consigam logo o acesso à primeira divisão do futebol baiano para que a gente possa noticiar a estreia com derrota do Serrano Sport Club no Campeonato Baiano, em lugar da vitória do Quinze ou do Esperança, na estreia do Baianão.

Rogério Luiz Oliveira, 16 de janeiro de 2011

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